Distancia entre os teóricos da educação ambiental e as práticas educacionais
por Arthur Soffiati – Embora tenha trabalhado com educação ambiental em comunidades de pescadores, trabalhadores rurais e moradores de áreas urbanas periféricas, minha experiência maior se concentra na escola. É para ela minha proposta de ecoeducação e é nela que encontro atualmente graves gargalos.
Um aspecto que cada vez mais se delineia é a distância entre os teóricos da educação ambiental e as práticas educacionais e pedagógicas nas escolas. O nível de teorização melhorou de forma significativa nos últimos dez anos. Era inevitável perceber-se, entre os estudiosos, uma nítida distinção entre posturas conservadoras e posturas críticas. Como os conservadores, por tradição, não costumam pensar seu conservadorismo, não houve preocupação da parte deles em detectar e teorizar sobre tendências conservadoras. Ficou-se apenas no plano das práticas.
Não assim com os críticos, historicamente mais pensadores que realizadores. A educação ambiental crítica seguiu vários caminhos indicados com novos adjetivos apostos ao adjetivo “ambiental”: educação ambiental crítica, educação ambiental transformadora, educação ambiental para a gestão, educação ambiental libertadora, educação ambiental emancipatória, ecopedagogia, alfabetização ecológica etc, todas elas com pequenas nuances entre si. Algo semelhante aos grupos de esquerda que se constituíram durante o regime militar que imperou no Brasil entre 1964 e 1985.
Grande parte dos teóricos de uma educação ambiental crítica e progressista nunca colocou o pé numa sala de aula dos ensinos fundamental e médio. Eles desconhecem, em suma, a realidade da escola e da educação ambiental dentro dela. Embora eu não trabalhe mais no ensino fundamental e médio, nunca perdi o contato com escolas urbanas e rurais de uma região interiorana do Estado do Rio de Janeiro. Este contato me permite observações, reflexões e a conclusão de que a escola é profundamente conservadora. Posso estender minhas afirmações às escolas de ensino superior, onde trabalho atualmente com exclusividade.
Este conservadorismo se manifesta tanto na dimensão social quanto na dimensão ambiental. Os professores conservadores limitam-se a ministrar (mal) seus conteúdos programáticos sem nenhuma preocupação crítica com o social e com o ambiental. Já os professores “de esquerda” costumam valer-se do magistério como púlpito para proferir seus discursos panfletários em que a questão ambiental está excluída por antipatia, por desinteresse e por desconhecimento. Reina, com relação à problemática ambiental, um grande conformismo da parte de conservadores e progressistas.
Quanto à transversalidade da temática ambientalista, ou ela ainda não deslanchou ou revelou-se um tremendo fracasso. A educação ambiental envolvendo toda a escola é um fardo do qual todos os professores querem se desvencilhar. Para tanto, a transversalidade prevista nos Parâmetros Curriculares Nacionais se resume a convidar alguém mais ligado à área ambiental para proferir uma palestra com a presença dos professores e dos alunos, mais como dever do que como prazer.. Tenho me recusado a contribuir para o fortalecimento desta postura cômoda. Há outras iniciativas inócuas em termos de mudança de atitude, tais como “projetos” (a mais sofrível prática na escola recebe o nome de projeto) de reciclagem de papel e latinhas, exposições de trabalhos de alunos, plantio de árvores em datas significativas, talvez alguma passeata festiva e… nada mais.
Assim, a educação ambiental acaba restrita às disciplinas de ciências e biologia, já que elas tratam de ecossistemas e problemas ambientais por um ângulo biologizante. Como estas disciplinas já cumpriam estas tarefas antes da nova Lei de Diretrizes e Bases, não é exagero afirmar que nada ou pouco mudou. Salvo experiências pioneiras e isoladas que desconheço. Em resumo, parece que estamos aquém da proposta que fiz, há cerca de 15 anos, de criar uma disciplina com o nome de educação ambiental e que tantas críticas me renderam.
Uma das práticas que vêm ganhando terreno nas escolas particulares é a aula de campo. Poder-se-ia concluir que cresce a tendência à Educação Ambiental ao Ar Livre. Há quem defenda que educação ambiental deve ser ministrada fora de sala de aula, considerada em si um ambiente conservador. No entanto, as aulas de campo não passam de extensão do biologismo.
Nas minhas aulas de “Sociedade e Natureza” em Serviço Social, curso com uma marca de esquerda conservadora, não descuro de uma abordagem crítica no que concerne ao econômico, ao social e ao político, mas também não deixo de lado uma abordagem transdisciplinar que valoriza o geológico, o biológico, o ecológico, os ecossistemas e as aulas de campo. Busco a integração entre ciências humanas e naturais. As duas áreas podem ser denominadas de humanas, pois são formadas por campos de saber constituídos pelo ser humano. Quanto aos ensinos fundamental e médio, considero-os um grande desafio para o qual não tenho resposta.
Aristides Arthur Soffiati Netto é mestre e doutor em História ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor da Universidade Federal Fluminense. Publicado en la Folha da Manhã, Campos dos Goytacazes, 11 de Dezembro de 2005.